Sobre a lei recentemente encaminhada ao congresso pelo ex-presidente Lula e que agora sobe para sanção da presidente Dilma, que visa criminalizar as chamadas palmadas pedagógicas, é importante aprofundar a análise, vez que a aparente inocência da norma esconde razões e conseqüências de importância ímpar e decisiva para o conjunto da sociedade brasileira, tanto no que alcança a integralidade da família, quanto para a relação sociedade-estado. Abaixo vou esclarecer porque a proposta é um tremendo equívoco, nos seus aspecto formais, em seu conteúdo e em seus objetivos.
EQUIVOCADA EM SEU CONTEÚDO.
A iniciativa parte de uma equivalência errada “palmada = violência”. São coisas distintas. Não me ocorre que qualquer pessoa adulta nunca tenha recebido, quando criança, uma palmada de seus pais e nem por isso sinta ter sido violentada ou apresente comportamentos sociopáticos. Propalar que uma palmada seja traumática para a criança é puro chute; equivale a acreditar que uma criancinha quando está aprendendo a andar e sofre uma daquelas inúmeras quedas nas quais cai sentada ficará por isso paraplégica. Essa crença indica extrema ingenuidade e desconhecimento dos mais elementares rudimentos do desenvolvimento infantil.
Outro erro de conteúdo ainda mais grave e mais acentuado que o anterior é a afirmativa recorrente dos defensores da lei antipalmada de que controlar a criança com uma palmada é introduzi-la no mundo da violência, é a uma forma de induzi-la a aceitar a violência como recurso legítimo no alcance dos objetivos. Assim, por imitação, a criança iria se tornar violenta. Escapa a esses ideólogos que a imitação é somente um dos componente da formação da personalidade, outros fatores aí se somam, inclusive a capacidade que o meio (os pais) tem de controlar a impulsividade e agressividade naturais da criança. Fosse somente a imitação a constituir a personalidade e pautar o comportamento da criança, bastaria um pai bom e tolerante, que nunca estapeasse o filho, para que o filho se tornasse também bom, isto é, uma pessoa pacífica e não agressiva. Mas o que se vê rotineiramente são pais desesperadamente tolerantes, que tudo permitem e fazem para seus filhos. Tolerantes com todas as suas extrapolações; em contraposição a filhos agressivos, violentos e egoístas, não raro descambando para a delinqüência. Não! Os filhos não imitam tudo de seus pais; na verdade, os filhos filtram das influências dos pais aquelas que são adequadas a seus desejos. O que inibe a impulsividade e a agressividade (naturais em toda criança) é o controle que o pai ou a mãe exercem sobre o filho. Nesse sentido, controle é mesmo o objetivo educacional.
Não há, contudo, somente uma única forma de controlar. Esta, depende muito do temperamento, cultura e recursos dos pais. Entre as formas de controle podem ser citados o controle verbal (através do sermão, diálogo, ou da instrução), os castigos físicos como surras e palmadas e os castigos de restrição da liberdade e retirada de privilégios. Alguns desses se tornaram obsoletos, como as surras, outros, sabidamente inócuos com crianças, como os sermões/assertivas verbais e, por fim, o grupo variado dos castigos que hoje são conhecidos e pesquisados e que bem empregados podem se ajustar às várias situações que exigem controle.
Para que a palmada seja completamente abandonada e o controle verbal possa lograr êxito é preciso que este seja capaz de desempenhar as funções ora ocupadas pela palmada. Uma função, em especial, fica muito prejudicada nessa substituição: o controle da desobediência. Há várias situações, cotidianas, em que a criança pequena, tentada por seus impulsos, não será contida por palavras, por mais ásperas e gritadas que sejam. Quem nunca viu uma mãe quase “louca” em um supermercado a suplicar para que o filho devolva a caixa de chocolates à gôndola? Ou crianças rolando de birra no chão ante a negativa da mãe em lhe dar o sorvete? Nessas situações de birra agressiva ou escandalosa e de recusa à obediência é necessária a contenção do comportamento da criança. Ocorre que conter uma criança em situações semelhantes (segurando-lhe os braços, por exemplo-que já é uma ação física) é extremamente cansativo e a criança tende a resistir a essa contenção (se agitando, chorando, chutando, xingando, cuspindo etc) levando os pais a afrouxarem em seu controle. Assim, a conduta de resistência da criança vai sendo aos poucos reforçada, pela exaustão a que levam os pais. Daí para frente, com o repertório de desobediência reforçado, a criança passa a ser “dona” de si e da família, submetendo os pais a seus mimos e caprichos. É preciso ficar claro para essas crianças que sua conduta lhes traz conseqüências desagradáveis, entre as quais, o “castigo da cadeirinha” e, em sua impossibilidade, a palmada pedagógica. Somente a certeza dessa punição pode controlar com eficácia os comportamentos desobedientes da criança pequena. É preciso ficar claro: a criança ser controlada por ações verbais é secundário à aprendizagem de ser controlada por ações físicas.
EQUIVOCADA EM SUA FORMA.
A intrusão do estado no íntimo da ação familiar educativa sinaliza uma direção autoritária (poderia se dizer até mesmo fascista) que visa desqualificar a família como instância autônoma e básica na formação das crianças. Onde passa um boi, passa uma boiada, diz o ditado popular. Uma vez aberto o precedente, o estado poderá se arvorar em regulador de outras situações educacionais: qual a comida devem os pais dar aos filhos?; que programas deverão os filhos ver?; que assuntos os pais poderão aventar com os filhos e quais seriam proibidos?; que castigos os pais poderiam aplicar aos filhos e quais seriam proibidos?; como os pais deveriam regular a iniciação sexual dos filhos e toda a sorte de situações para as quais haveria um jeito “certo” e prescrito por algum especialista burocrático do governo, até que chegássemos finalmente ao momento em que as relações familiares se tornariam baseadas não mais no amor, mas na adequação à lei, esvaziando a família do que tem de mais sagrado: preparação amorosa de cada novo membro da sociedade humana. Um passo nessa direção já foi dado quando se estabeleceu a norma de que o pai que não amar seu filho pode ser condenado a multas e indenizações.
Não se pense aqui que esse absurdo jamais seria alcançado. Na ficção, George Orwell nos dá uma amostra dessa situação em seu terrível, mas imprescindível, 1984. Para aqueles que não acham a ficção argumento válido, exemplifico com a história real. O Camboja revolucionário e a chamada “Revolução Cultural” da China de Mao Tzé Dong. Nesses paraísos, os filhos (ainda crianças) eram braço auxiliar da repressão estatal e não titubeavam em denunciar seus próprios pais ante a presença de qualquer sinal de atividade proibida, como, por exemplo, ler, ou recitar poesias que enfatizassem o “eu” em lugar do “nós”.
EQUIVOCADA EM SEUS OBJETIVOS
Se o objetivo da lei “antipalmada” é mesmo o de proteger a criança de maus tratos praticados por seus pais, então seus efeitos são completamente inócuos, pois já há leis penais que são aplicáveis às várias situações de aviltamento da criança, enquanto que o texto proposto não produz efeitos na justiça penal. Contudo, se o objetivo da lei é o de “conscientizar” os pais de sua responsabilidade e de seu papel, estamos diante de um governo que não sabe o que fazer para evitar que quarenta mil jovens morram por ano no Brasil em crimes decorrentes do tráfico e consumo de drogas, mas se julga competente para ensinar aos pais como devem educar seus filhos. Como são pretensiosos os nossos técnicos estatais! O governo quer proibir a palmada nos filhos, mas acha legítimo a palmada nos pais!
Na verdade, essa é mais uma ação de um grande projeto de reengenharia social que visa: 1º esvaziar o sentido da família tradicional, 2º esvaziar a sociedade dos valores cristãos, 3º implementar o projeto revolucionário marxista-gramsciano, mas este último parágrafo é tema para um próximo post.
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