terça-feira, 22 de janeiro de 2008

PACIFISMO DE PASSEATA, ILUSÕES E MISTIFICAÇÕES


Vivemos hoje o permanente discurso da paz. Fala-se de paz na igreja, fala-se de paz na escola, fala-se de paz no trabalho, em reuniões de vizinhos, em festas, batizados e casamentos. Artistas vão à televisão “pedir” paz. Outros falam que o mundo precisa é de paz, a solução é a paz etc. Não ser militante pacifista chega a ser pior que ser um criminoso ordinário. Mas os eventos que mais marcam o discurso pela paz são as passetas e as instalações. Naquelas, artistas e figurões da mídia, todos de branco, expressam seu efusivo e profundo apelo pacifista; nestas, centenas de cruzes são fincadas na areia, simbolizando os mortos e vítimas de um mundo carente de paz!

Curioso é que, apesar da adesão geral e irrestrita, a paz, simplesmente... não acontece. Por que algo ansiado por todos (até onde sei, ninguém se apresentou contra a paz), com tamanha sinergia, não se converte em realidade? Deve haver algo de errado em um discurso universal que fracassa em seu intento. Esse imbróglio é o que vou tentar esclarecer neste post.

HIPOCRISIA E DISSOCIAÇÃO
De início, se observa que há uma lacuna entre o discurso e o efeito final, vale dizer, há uma diferença entre o discurso e a ação, quando o efeito prático é contrário ao discurso. Ao distanciamento entre o que se diz e o que se faz, quando conscientemente praticado, dá-se o nome de hipocrisia. Quando ocorre à margem da consciência pode-se dizer que se trata de uma dissociação.

A hipocrisia, como disse La Rochefoucauld , é “a homenagem que o vício presta à virtude” (“L’hypocrisie est un hommage que le vice rend à la vertu”), ou seja, em tudo o hipócrita tenta passar a aparência de que ama a virtude que, secretamente, despreza e rejeita. Esse sujeito dissimulado sabe que há risco de prejuízo para algum interesse seu, caso revele sua crença autêntica. Nesse sentido, pode-se dizer que muitos “pacifistas” não são, intimamente, pacifistas coisa nenhuma, mas usam esse rótulo para alcançar objetivos escusos. O exemplo clássico dessa estirpe é o protoditador venezuelano Hugo Chávez. O sujeito se proclama um pacifista ao exigir do governo colombiano a abertura de negociações com as FARCs (esta, um grupo de narcoguerrilheiros esquerdistas que seqüestram e matam civis e exportam cocaína para o mundo todo). O que o hipócrita ama verdadeiramente não é a paz, o embusteiro quer é dar status de grupo legítimo a seus parceiros terroristas na caminhada para consolidação de seu poder ditatorial não somente em seu país, mas em toda a américa latina. Ao exigir do governo constitucional colombiano algo que ele não pode atender (sentar-se à mesa com os narcoguerrilheiros e legitimar a conduta criminosa) o hipócrita faz pose para a mídia internacional de amante da paz enquanto verdadeiramente deseja destruir a ordem constitucional da Colômbia e instalar ali mais um de seus fantoches.

A dissociação é um dos chamados mecanismos de defesa do ego, estabelecido por Freud nos alvores da psicanálise. Consiste, basicamente, na co-existência na mesma personalidade de duas idéias incompatíveis entre si. O sujeito não se dá conta de que professa idéias, cuja validade de uma, exclui necessariamente a validade da outra. Por exemplo, o indivíduo que é extremamente cuidadoso e zeloso com a segurança da família, mas que ao dirigir se comporta irresponsavelmente cometendo todo o tipo de ações perigosas em alta velocidade. Ao ser questionado, o infrator afirma que é ilusão das pessoas e que ele é muito seguro na direção. Explicado o termo, vejamos como se aplica ao discurso pacifista. Um exemplo concreto de dissociação pode ser encontrado em um evento real noticiado ano passado. Um conhecido e importante ator global, com grande evidência até hoje, foi flagrado comprando drogas. Nada demais, vez que o consumo de drogas é muito difundido entre os artistas em geral. Ocorre, contudo, que o ator, no fim-de-semana anterior, havia participado, com toda a pompa e circunstância, de uma marcha pela paz no calçadão de Copacabana. O sujeito não se deu conta de que sendo comprador de drogas se torna parceiro financiador do traficante, com toda a sorte de crimes atrozes, assassinatos, seqüestros e mortes violentas decorrentes, justamente aquilo que visava coibir com sua “marcha pela paz”. Quantas e quantas pessoas se tornam consumidoras de produtos ilegais, ou seja, financiam crime (individual, de gangue, máfias e crime organizado) de um lado e de outro professam o seu louvor ao pacifismo?

A PAZ ESTÁ NA LEI
Embora passe despercebido, o traço que une tanto pacifismo hipócrita quanto o pacifismo dissociado é a desvinculação da paz do horizonte da Lei, como se fosse possível, no mundo civilizado, viver em paz sem a observância da Lei. O discurso pacifista busca construir atalhos para a paz fora do compromisso com a Lei. É esse o seu calcanhar-de-aquiles e por isso temos um discurso pacifista onipresente, cujo efeito prático é aumentar a ... insegurança!

Retomando um pouco a história da civilização ocidental, vamos encontrar dois marcos legais. No mundo heleno, a Lei, que até então, nessa e em outras culturas contemporâneas, já existia, foi elevada ao posto de principal fator institucional de solução de conflitos, superando a arbitragem e o despotismo. Também a tradição judaica sustenta a Lei como expressão da vontade de Deus para a solução dos conflitos.
Pois bem, toda essa tradição de amor, respeito e apego à Lei, ao longo do desenvolvimento histórico da civilização ocidental, garantidora de sociedades com baixíssimo nível de criminalidade, passou a ser sistematicamente desprezada, nas últimas décadas, em favor de ideologias que dispensam a obrigação de seguir as leis para se alcançar uma sociedade justa e pacífica, culminando na situação de praticamente guerra civil que chegamos hoje no Brasil. Ao general Santander, consolidador da independência da américa espanhola devemos a frase: "A independência conquistamos com as armas. A liberdade conquistaremos com as leis. " A Liberdade só existe em nações que aprenderam a amar a Lei.

Edson Moreira




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